HORAS PERDIDAS
João Vitor Haeberle Jaeger*
Ventava. Era um vento daqueles de assoviar nas curvas da praça. Mas, a despeito dessa intempérie, um velho senhor caminhava por entre as árvores e catava folhas que pesavam no chão. Na praça, não havia mais ninguém, apenas um banco a esperar por ele. Com algumas folhas de árvore e de jornal nas mãos, o velho se sentou no colo do banco amigo e passou a contemplar o tempo.
Era difícil ler com aquela ventania toda. Nem as folhas, nem as palavras paravam em suas mãos. Deixou o jornal também ser carregado. Olhou no relógio e as horas também voavam. Iam além das nuvens e, para lá, levavam o bom tempo. Levantou-se e seguiu caminhando por uma trilha. Perdia-se entre um passo e outro, uma folha e outra. Uma hora ou outra, acabava por voltar ao seu banco amigo. E lá ficava a contemplar o vento.
Algumas folhas voavam ao seu encontro, outras fugiam, outras não davam bola. Ele também desviava de algumas, catava outras ou não se preocupava. Numa tarde movimentada como aquela, não adiantava tentar escapar. Mas, mesmo assim, forçou uma fuga.
O velho senhor misturado com as folhas, catando horas perdidas, ergueu-se e foi embora. Carregava consigo um pedaço de vento, pois o que tinha já havia decolado. Na busca de outras horas que há tempos não voltavam, correu. Correu atrás do ponteiro, mas o tempo voava mais depressa. Acabou por tropeçar em uma raiz de árvore e cair com o rosto no chão. Virou folha seca e voou com suas horas perdidas.
*Escritor
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