terça-feira, 21 de dezembro de 2010

LUTO

Assim como a sexualidade, a morte é um assunto que carrega em si vários tabus, mesmo que façamos parte de uma sociedade desenvolvida e culta. Este é um assunto muito pouco agradável aos ouvidos e acredito que a todos os demais sentidos. Com bastante freqüência
Freud diz que o luto, de modo geral, é a reação à perda de alguém querido, de alguma abstração ou o ideal de alguém. Desta forma, o trabalho do luto consistiria em que toda a libido seja retirada do objeto e transferida para outro, o que é sabido por todos que trabalham nesta área, é bastante penoso. Ninguém deseja de bom grado abandonar um objeto amado, mesmo que lhe seja acenanda uma outra posição. Segundo Freud, essa oposição pode ser tão intensa, que originaria alguns transtornos bastante sérios citando principalmente os processos de melancolia.
John Bowlby divide o luto em quatro etapas:
1) Fase inicial de desespero agudo;
2) Fase em que há um desejo intenso pela presença do falecido e busca por esse;
3) Fase de desorganização e desespero. É como se aqui a ficha caísse e a pessoa começa a assimilar a realidade da perda;
4) Fase da reorganização, na qual os sentimentos agudos da perda começam a desaparecer e a pessoa se sente voltando à sua vida normal. Nesta fase o falecido é lembrado com alegria, bem como com tristeza, e há uma internalização da imagem da pessoa perdida. Uma passagem suficientemente boa destas fases vai depender muito dos vínculos e das vivências entre todos os envolvidos no processo.

No luto patológico o que acontece é uma incapacidade na transposição das fases já ponderadas ou um adiamento do referido luto. Frequentemente, vemos que defensivamente a tristeza é substituída por excessiva praticidade e até mesmo frieza, o que só nos confirma a utilização de mecanismos inconscientes que têm por objetivo tornar menos dolorosa a angústia de aniquilamento pela perda do objeto amado. Não só isto, mas possivelmente a própria finitude, uma vez que a morte sempre remete-nos a nossa própria fragilidade.
Decorrem também nos processos patológicos, daí já uma vivência excessivamente destruidora do luto, sentimentos de culpa e remorso. Nestes casos, quando aquele que fica imagina que deveria ter morrido no lugar do outro ou quando as vivências anteriores não foram satisfatórias, há remorsos, lembranças ruins e fracassos irrecuperáveis.
Nenhuma relação entre dois seres complexos pode ser simples, portanto também uma perda nunca tem um resultado linear ou totalmente previsível. A morte revela, ou configura a destruição, a ruptura de um vínculo, no real, objetivo e concreto, entretanto, há um lugar no espaço do simbolismo daquele que fica e isto não cessa de acontecer.
Quando me foi solicitado escrever sobre este tema pensei em ler um pouco e me preparar um pouco e encontrei uma citação em Sanders(1999), que particularmente me identifico e acredito que seja assim que nossos pacientes se sentem quando enlutados:

“A dor de uma perda é tão impossivelmente dolorosa, tão semelhante ao pânico, que tem que ser inventadas maneiras para se defender contra a investida emocional do sofrimento. Existe um medo de que se uma pessoa alguma vez se entregar totalmente a dor, ela será devastada- como que por um maremoto enorme- para nunca mais emergir para estados emocionais comuns outra vez”.
Na literatura nós encontramos estudos sobre dores e lutos que se prestam para a elaboração. Mas dor é dor; e em cada um vai doer de um jeito muito particular. Mesmo que recorramos aos nossos escritos elucidativos técnicos e teóricos, nossos pacientes, amigos, e nós mesmos viveremos nossas perdas como for possível. É importante uma compreensão não só analítica, mas também humana do processo do luto, posto que ele se presta a varias situações de perdas e não tem tempo de duração. Vai depender das condições de cada um para a realização do que se pode chamar de trabalho do luto ou elaboração das perdas.




JANICE MARTINI
ESPECIALISTA EM PSICANÁLISE VINCULAR
MEMBRO CORPO CLÍNICO

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